16/02/18

O Boêmio, Poeta e Compositor Carlos Fernando


A abertura do carnaval do Recife esse ano foi em homenagem a história do frevo, e no meio das atrações, em algum momento da noite, começou a passar a foto de vários nomes do frevo no telão atrás do palco, e um deles era Carlos Fernando.



Carlinhos - como era chamado pelos amigos - nasceu em Caruaru em 19 de Outubro de 1937, e começou na vida artística por volta de 1956 fazendo teatro com Luiz Mendonça, chegou até a escrever uma peça chamada “A Chegada de Lampião no Inferno”, inspirada no cordel clássico de José Pacheco.

A peça inspirou Carlos Fernando a compor em parceria com Geraldo Azevedo, o frevo “Aquela Rosa”, a primeira composição dos dois, e gravado a primeira vez num compacto de Teca Calazans em 1967. A música tirou em primeiro lugar na 2º Feira de Música do Nordeste, empatada com Chegança de Fim de Tarde, de Marcus Vinicius de Andrade.

“Carlos Fernando tinha escrito uma peça, um negócio de Lampião... e eu, porra, a maneira que ele escrevia, eu disse, rapaz você deveria fazer letra de música. Tem várias coisas que davam pra musicar. Acho que ele já tinha uma ideia, mas não tinha botado isso pra fora, isso de compor. Aí ele me deu Aquela Rosa, botei a música em cima, inscrevemos no Festival de Música Popular do Nordeste e ganhamos o festival”.
(...)
“Foi a minha primeira composição e também a dele. Foi inspirada nos corsos, que ainda existiam. O rapazes e as moças, dos carros,  iniciavam uma paquera jogando pitombas um nos outros. Não dava pra ser Aquela pitomba, então entrou a rosa”.
Revela Geraldo Azevedo.

Geraldo Azevedo foi o grande parceiro de música de Carlos Fernando contando com várias composições juntos. Amigos de longa data, tem música de Carlos desde o 1º LP de Geraldo Azevedo lançado em 1977, com a música “Caruaru City Jazz”, que foi censurada pela ditadura e por isso teve que mudar o nome para “Coração do Agreste”. Gravada na última faixa desse 1º disco de Geraldo, e ainda contando com um trecho de “A Feira de Caruaru” de Onildo Almeida nessa gravação.

Nesse disco, quase todas as músicas é de parceria com Carlos Fernando, das 8 faixas, 7 tem Carlos Fernando no meio como: “Barcarola de São Francisco”, “Domingo de Pedra e Cal”, “Em Copacabana”, “Juritis e Borboletas” dividindo parceria e “Cravo Vermelho” e “Fulô do Dia” que Carlos Fernando assina sozinho.




Geraldo Azevedo - Geraldo Azevedo (1977)

Carlos Fernando também assina parceria com Geraldo Azevedo em “Semente de Adão”, gravada no clássico disco “Cantoria 1”, disco de Geraldo, Elomar, Vital Farias e Xangai, gravado em 1984.



Cantoria 1 (1984)

Entre seus maiores sucessos estão “Canta Coração” (Canta, canta passarinho, canta, canta miudinho / Na palma da minha mão / Quero ver você voando, quero ouvir você cantando / Quero paz no coração.) em parceria com Geraldo Azevedo, gravado a 1º vez no disco “Inclinações Musicais” em 1981, de Geraldo Azevedo. E a música que mais fez sucesso foi “Banho de Cheiro” (Eu quero um banho de cheiro / Eu quero um banho de lua / Eu quero navegar / Eu quero uma menina / Que me ensine noite e dia / O valor do beabá.), clássico obrigatório em todo carnaval, gravado a 1º vez por Elba Ramalho em 1983 no disco “Coração Brasileiro”.


Geraldo Azevedo - Inclinações Musicais (1981)


Elba Ramalho - Coração Brasileiro (1983)

Mas a grande contribuição de Carlos Fernando foi ter idealizado e gravado a série de discos “Asas da América” num total de 7 LPs de frevo com todas as músicas de composição suas ou dividida com parceiros. Charlie (como também era chamado pelos amigos, ou ainda simplesmente CF) ressignificou o frevo aproximando-o da MPB, numa época em que o frevo basicamente não passava da pracinha do Diário em Recife em época de Carnaval. Adicionou guitarra elétrica e teclado ao frevo com arranjos contemporâneos como falou o produtor Geraldinho Magalhães, e ainda contando com artistas consagrados da MPB pra gravar cada um, uma música, dentre eles: Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Jackson do Pandeiro, Lula Queiroga, Nena Queiroga, Marco Polo, Flaviola, Geraldo Azevedo, Elba Ramalho e vários outros.

Inclusive, foi no 1º LP do Asas da América que Gilberto Gil e Jackson do Pandeiro interpreta “Sou Eu Teu Amor” de composição de Carlos Fernando e Alceu Valença, em homenagem a Cacho de Coco e seu bloco “Sou Eu Teu Amor” que desfilava no carnaval de Caruaru da década de 60 (como é contada aqui).

A partir do Asas da América, Carlos Fernando ainda idealizou e gravou uma outra série de 5 discos chamado “Recife Frevoé” e produziu mais um chamado “100 de frevo - é de perder o sapato” que conta com artistas como Spok, Maria Rita e Vanessa da Mata.

Sempre apaixonado por Caruaru, em 2007, no aniversário de 150 anos de Caruaru, Carlos Fernando grava um CD chamado “Crônicas Musicais de Caruaru”, onde conta parte da história da cidade em música como:

“Descendo a rua morava meu tio
Meu tio Mamede
Querido torcedor do Central de todo Agreste
Olhando de lado a casa de Souza Pepeu
Mané Grande e seu Coló
Minha tia Toinha
Seu Jotinha Florêncio
Dona otília vizinha...”
(trecho da música  “Rua Saldanha da Gama” - Geraldo Azevedo/Geraldo Amaral/Carlos Fernando)

“No botequim do Barbosa
Na rua da Matriz em Caruaru
Eu conheci a metáfora
Dos renascentistas e os gênio chaplinianos
Da cultura acesa e um agreste nu”
(trecho de “Rua da Matriz” - Geraldo Azevedo/Carlos Fernando)

“És Caroara, aru, arara
Estás presente onde estou
Caruaru azul palavra
Agreste aceso mon amour
Cabeça e membros dos bonecos
Que a mãe no barro recriou
A fantasia gênio e crua
Que a mão e a massa vão moldar
Quisera os gregos, os chineses e os romanos
Terem nos olhos o que temos por aqui
O sol nas frutas
A lua quase nua
O surreal na palavra dos poetas
Projetando um novo carnaval”
(clássica “Caruaru Azul Palavra” - Carlos Fernando)

“No apertar da hora
Perfieria de Caruaru
Onde morava os Beatles
Os beatles de Caruaru...”
(trecho de “Forrozear” - Carlos Fernando/Geraldo Azevedo.)
*A partir dessa música que a banda de pífanos de Caruaru ficou conhecida como os Beatles de Caruaru (a história completa ta nesse link).


Crônicas Musicais de Caruaru

Em 2009, Carlos Fernando foi homenageado do carnaval do Recife, e morre em 2013 devido a um câncer de próstata, e em 2014 foi um dos homenageados do São João de Caruaru.

O poeta, boêmio e compositor Carlos Fernando é uma dessas figuras que ficará sempre na memória e na história de Caruaru e de Recife, “né não Bicho?”

Um comentário:

Demóstenes Félix disse...

a grande contribuição do CHARLES foi ele ter existido!