09/01/19

O outro lado da adoção – ABANDONO


Registrado pela Revista Época em Julho/2009, a Veja.com em Agosto/2015 e o Diário Catarinense em Março/2018, mostra que as taxas de retorno aos abrigos continuam bem assustadoras.

Trecho do Diário Catarinense – Reportagem: Ângela Bastos | Repórter fotográfico: Diorgenes Pandini | Edição: Jeferson Cioatto | Arte: Maiara Santos e Ben Ami Scopinho:
Adotada aos seis anos e seis anos depois devolvida.
A reviravolta na vida da menina que de uma hora para outra teve de deixar a casa dos pais e voltar ao abrigo surpreendeu a juíza da Vara da Família e da Juventude de Jaraguá do Sul, Daniela Fernandes Dias Morelli, que decidiu por pagamento de pensão.
– Eu nem considero devolução, mas abandono. Em se tratando da idade, as chances de ela ir para uma adoção tardia eram poucas. Entendemos ser necessário pensar numa reserva financeira, a qual desse alguma autonomia quando completasse 18 anos – explica a magistrada.
Os pais foram obrigados a assumir o pagamento de pensão alimentícia. Os valores consideraram a situação financeira da família. Os custos foram divididos entre marido e mulher. O dinheiro foi depositado em uma caderneta de poupança e a coordenadora do abrigo ficou responsável pelo cartão, enquanto a Justiça acompanha a manutenção.

Trecho da revista Época – Kátia Mello e Liuca Yonaha. Colaboraram Martha Mendonça, Nádia Mariano e Rodrigo Turrer:
“Luiz, de 12 anos, chegou a uma das Varas da Infância de São Paulo apenas com uma mochila nas costas. Nenhum brinquedo, nenhum livro, nenhum CD. Além de trazer poucos pertences, o menino parecia triste. Bem triste. Estava ali para ser devolvido. Depois de cinco anos em uma família, a mãe que o adotou não o quis mais. “Foi devolvido como se fosse um saco de batatas”, disse a psicóloga da Vara da Infância, Mônica Barros Rezende, que acompanhou o caso. A alegação da mãe adotiva foi que ele não obedecia mais. “Não aguento mais. Ele desobedece, falta na escola”, teria dito ela. A intervenção do Conselho Tutelar não adiantou.”

Trecho da Veja.com – Por: Nicole Fusco:
Cadastro Nacional de Adoção, do Conselho Nacional de Justiça, registra 130 casos de crianças que retornaram aos abrigos desde 2008: uma média de DUAS a cada 45 dias
“Mas o que leva um casal a querer devolver uma criança adotada depois de um processo que envolve espera e enorme expectativa? Para a promotora Helen Sanches, especialista em convívio familiar, a desistência é resultado da falta de preparo dos futuros pais. “A criança adotada tem uma história de vida, de violência e sofrimento, o que vai tensionar a fantasia dos pais com relação a ela. Se a pessoa não estiver preparada, no segundo ou no terceiro problema a ideia de que o filho é adotado vai assumir um peso excessivo para ela”, diz.”
“A psicanalista Maria Luiza Ghirardi, que tem um mestrado sobre o tema, aponta como estopim da crise de convivência a maneira como os pais lidam com os temores sobre a origem da criança – especialmente as incertezas sobre os pais biológicos. “Se os pais não conseguirem assimilar a criança, colocando-a no imaginário na condição de filho, ela vai ser sempre vista como coisa que não pertence a eles e que, por isso, pode ser devolvida”, disse.”

“No entanto, apesar do caráter definitivo, a Justiça acata algumas exceções e opta pela devolução sob o argumento de preservar o bem-estar da criança. Isso porque, em um lar onde há rejeição, os traumas vividos – não só emocionais, mas também físicos, já que a negação pode resultar em maus-tratos – podem ser maiores do que se ela tiver a oportunidade de encontrar outra família. “Se os pais adotivos estão renegando o filho, deixar a casa pode ser benéfico”, diz a psicanalista Maria Luisa.
Há três tipos de desistência analisadas pela Justiça: 1) ainda durante o período de estágio, porque a adoção ainda não aconteceu e o recuo é previsto em lei; 2) após a adoção, quando o registro de nascimento já foi alterado para o nome dos pais adotivos, e nesse caso os pais respondem por abandono de menor; e 3) quando menores são acolhidos por um parente dos pais biológicos, que depois desiste da responsabilidade. Nesses casos, o parente não é responsabilizado judicialmente, mas o menor deve ir para um abrigo quando a Justiça descobre o caso. “Não se pode processar essa pessoa porque ela não acionou o conselho tutelar para pedir a adoção”, diz Helen Sanches.
As crianças que enfrentam a rejeição podem desenvolver problemas emocionais e outras não conseguem uma segunda chance. “Os prejuízos estão na diminuição de confiança da criança, dificuldade de estabelecer novos vínculos e de receber amor”, diz a psiquiatra Maria Luisa.”

Mas há casos mais felizes. Em dezembro do ano passado, uma menina de seis anos encontrou o casal Cibele e Diogo Vogel, em Brasília. Oito meses antes, a menina e o irmão haviam sido adotados por outra família, que decidiu ficar com o menino e devolver a menina. “Ela é muito falante, muito carinhosa. Foi uma experiência surpreendente, porque a adaptação dela foi muito tranquila. E nós não enfrentamos resistência”, diz Cibele. Os irmãos se encontram quinzenalmente. E qual a lembrança que a menina guardou dos primeiros pais adotivos? “São como tios distantes”, diz a nova mãe.
Vejam as principais razões da devolução e como evitar que os problemas usuais cheguem a esse ponto apontados pela revista Época:
Problema: Após anos da adoção, os pais dizem que não é possível mais ficar com a criança por dificuldades de convivência. É muito comum isso acontecer quando os filhos chegam à adolescência e começam a testar os pais
O que fazer: Entender que a adoção é um ato irrevogável. Os conflitos acontecem com pais biológicos ou adotantes, principalmente na puberdade. A criança adotada pode estar testando os pais se eles realmente a amam. É preciso falar com as crianças sobre suas dificuldades. E, se necessário, procurar a ajuda de um técnico judiciário ou um psicólogo
Problema: O adotante tem um sentimento de bondade ao realizar a adoção. Pensa que pode “salvar” a criança de um meio em que ela se encontra, com uma boa educação, enfocando apenas as necessidades dela. O altruísmo pode esconder uma baixa autoestima de quem adota, e isso poderá influir no relacionamento com a criança
O que fazer: Entender que nenhuma criança a ser adotada será “salva”. Ela será uma integrante da família. Se os pais se sentem altruístas, terão dificuldade em colocar limites e a criança nunca vai corresponder a suas expectativas
Problema: Casais que não podem gerar seus próprios filhos podem ter expectativas exageradas em relação às crianças adotadas. Dependendo de como a infertilidade é elaborada, ela terá um efeito sobre a criança. Ao mesmo tempo que a criança adotada vai oferecer a possibilidade de uma nova família, ela também será a lembrança de que eles não puderam ter filhos
O que fazer: Elaborar o luto da impossibilidade de ter filhos biológicos. Compreender que as idealizações tendem ao fracasso, uma vez que a criança nunca vai alcançar os exatos ideais colocados pelos pais. Seja ela biológica ou não
Problema: Alguns casais tentam apagar o passado da criança. Existem aqueles que querem mudar o nome da criança e esconder que ela sofreu abandono. Ou ainda aqueles que apontam os problemas como consequência de sua origem biológica, ao chamá-la por exemplo de “sangue ruim”
O que fazer: Contar sempre a verdade. O passado da criança pertence a ela. A sugestão para o nome é que os pais considerem o nome de origem e acrescentem o de sua preferência. E nunca culpar o comportamento da criança por aquilo que ela viveu anteriormente
Problema: A fantasia de devolução costuma surgir com o aumento dos conflitos vividos na relação com a criança. Permeia a relação adotiva como uma possibilidade. Mas é preciso reforçar que a devolução só é considerada no estágio de convivência, ou seja, antes da adoção. Ou quando traz danos irreversíveis à criança
O que fazer: Quando a fantasia de devolução se intensifica, é sinal de que a relação pais-filho apresenta dificuldades que necessitam ser compreendidas e trabalhadas, com a ajuda de psicólogos e assistentes sociais
Fontes: Época e Veja.com/via adoção Brasil.

Nenhum comentário: