09/05/18

Cantoria, solidariedade e cidadania


Modalidade de expressão artística situada entre a oralidade e a escrita, a cantoria de viola é uma ferramenta de construção da identidade do Nordeste. Com isso, além de enaltecer as virtudes e características do povo nordestino, ela serve como um instrumento de reflexão sobre o contexto que a rodeia, e estimulando o público a agir como agentes sociais proativos, que protagonizam mudanças em seu ambiente de vida.

Exemplo dessa finalidade pôde ser constatado no último domingo, dia 06, quando ocorreu a primeira edição do projeto Cantoria Solidária. Idealizado pelo poeta repentista Luciano Leonel, o intento possui duplo objetivo: catapultar a produção do repentismo local e promover assistência social a comunidades carentes.


O palco para o início do projeto foi a sede da Associação dos Moradores do Salgado, contando com o apoio da presidente da entidade, Norma Maciel. O evento iniciou por volta das 16h, e participaram os cantadores Luciano Leonel, Bionor Gonçalves, Antônio Barbosa e Hemerson Vasconcelos. Sextilhas, canções, poemas e motes marcaram a programação do evento, prestigiado por uma plateia seleta e interativa.

Mesmo nos moldes de uma cantoria tradicional, o show não teve a famosa ‘bandeja’, comumente utilizada para arrecadar o cachê dos artistas. A entrada para prestigiar a cantoria foi a doação de 01 quilo de alimento não-perecível. Todo o material arrecadado será utilizado pela Associação, para atender a necessidade de pessoas carentes da comunidade.



A presidente da Associação dos Moradores do Salgado enalteceu a proposta. “Iniciativas como essa engrandecem nossa cultura e movimentam positivamente o nosso bairro. As pessoas precisam de arte e de poesia, pois isso embeleza a vida”, destacou, salientando que a instituição sempre estará aberta a atividades com esta perspectiva.

A plateia foi composta por artistas, jornalistas, advogados, profissionais liberais e pessoas da comunidade. O delegado Erick Lessa prestigiou o evento, atendendo a um convite da presidente da Associação e dos próprios cantadores. Ele comentou que iniciativas desta natureza são de extrema importância para perpetuação dos elementos da nossa ancestralidade. “A nossa cultura popular é muito rica e necessita ser mais valorizada, tanto pelo poder público quanto pela sociedade civil. Escutar esses versos nos emociona e também nos faz refletir sobre a vida”, disse.

De acordo com o poeta Luciano Leonel, existe a intenção de expandir o projeto. “Vamos apresentar esta ideia para líderes de outros bairros, de outras comunidades, e fortalecer a cantoria de viola em Caruaru, que é um verdadeiro polo de grandes repentistas e não pode ficar adormecido”, observou.

Além de a iniciativa, por si só, já ser um ato de solidariedade e de protagonismo social, os versos proferidos pelos cantadores em muitos momentos (denominados “baiões”, na linguagem dos repentistas) também apresentavam um cunho social relevante. Confira algumas das estrofes improvisadas durante aquela tarde:

Quero boa educação
Da velhice à juventude,
Um compromisso mais sério
Pra salvar nossa saúde,
Porém para isso o povo
Tem de ter nova atitude.

(Luciano Leonel)

Que a nova política ajude
Este país em ruína;
Que acabe o caixa-dois,
Que tenha um fim a propina,
Pois acabando essas coisas,
A corrupção termina.

(Hemerson Vasconcelos)

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