19/08/18

O trem fantasma. por Maciel Melo


– Moça, me venda uma vírgula?
Preciso de uma pausa para um cavaleiro andante que perdeu as rédeas pelos prados da vida e desembestou por esse mundo de meu Deus.
– Um momento, senhor! Deixe-me ver se no depósito ainda resta alguma, pois descarrilhou um trem carregado de consciências e, de lá pra cá, nunca mais tive tempo de tirar uma madorna; a toda hora chega alguém pedindo uma vírgula. 
Meu estoque de paciência está se esgotando, e só o que resta na prateleira são exclamações. Vírgulas, pontos finais, pontos de interrogações... levaram tudo! Até um dia desses ainda restavam algumas reticências espalhadas por aqui, mas outro dia apareceu uma menina meio desconfiada, com um jeito de quem não queria nada, e catou tudo. 

Está distribuindo por aí. Olhe, seu moço, o que mais se vê na rua é gente reticente; sem perspectiva, sem emoção, e sem assunto. Ê, meu senhor, o mundo está desgovernado, feito um caminhão sem freio descendo a ladeira de uma estrada de barro, num dia de chuva, com um doido dirigindo, e carregando um país inteiro na carroceria. 
Não sei como isso vai parar, não! 
O trem que descarrilhou era fantasma, o maquinista era um sósia de Drácula, o cobrador fugiu num trolha, o trolha saiu do trilho, e o povo tá só a tralha.

Outubro vem aí!

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