Na época em que o rádio e os discos de vinis
imperavam como as principais plataformas de difusão musical e cultural, mais
especificamente na década de 60, existiu um personagem sertanejo Caruaruense
chamado “Coronel Ludugero” que arrancou muita gargalhada de quem o ouvia.
Luiz Jacinto Silva (não é o cantor de coco)
nasceu em 1929 em Caruaru, estudou no Colégio Caruaru (hoje o colégio
Diocesano) até concluir o ginasial. Luiz Jacinto fez de tudo um pouco,
trabalhou ajudando o pai fazendo cela de cavalo, foi ajudante de pedreiro,
trabalhou entregando pães numa padaria aos 12 anos, trabalhou nos correios
entregando telegrama aos 16 e ficou nos correios até ingressar na vida
artística.
Artisticamente, tudo começou na Rádio Clube de
Pernambuco onde ele fazia o programa das 12:30h sob o patrocínio da Manteiga
Turvo. Até que em 1960 conheceu o produtor e músico Luiz Queiroga que (com o
incentivo também do radialista Hilton Marques) criou o personagem “Coronel
Ludugero”.
Sobre o nome, o “Coronel” veio em alusão ao
coronelismo no Nordeste, e o “Ludugero” veio de um amigo de Luiz Jacinto que se
chamava Ludugero e era muito querido na cidade, vivia sempre de bem com a vida,
alegre e fazendo piada e em homenagem a esse amigo, ele acrescentou o nome
“Ludugero”.
No início, o coronel Ludugero se apresentava
sozinho interpretando textos e pequenas músicas que Queiroga escrevia, mas
pouco tempo depois conheceu Irandir Peres Costa, que também ganhou um
personagem por Queiroga para atuar junto com Ludugero, que era “Otrópe”, que na
trama era o secretário e braço-direito do coronel. Também na mesma época,
conheceram no RJ a atriz venezuelana da cidade de Caracas, Mercedes Del Prado
que tinha feito seus estudos em belas artes na Venezuela, já tinha se mudado
pro Chile e foi parar no RJ pra trabalhar com comédia, e acabou entrando pra
trupe do Coronel Ludugero fazendo a personagem “Felomena”, a esposa do coronel.
Apesar que nos primeiros programas, antes de Mercedes, essa personagem era
apresentada como “Dona Rosinha”, que era interpretado pela atriz Rosa Maria.
No enredo criado, o coronel Ludugero era um
personagem que retratava de forma humorística a figura dos coronéis, que muitos
dos quais serviam a Guarda Nacional e tinham grande prestígio por parte da
população. Ludugero era um homem simples, sincero, contador de histórias e
casado com dona Felomena, no qual era perdidamente apaixonado. Dentre a
personalidade e qualidades do personagem, ainda era um bom aboiador, cantador
de viola e poeta e as vezes entrava em umas crises de ansiedade e nervosismo.
Tinha ainda seu fiel escudeiro e secretário Otrópe, no qual ele orientava nas
questões políticas e nos negócios, um Jumento chamado Zé Fernando e um cachorro
chamado Clemente Mitróvis, um nome russo para um puro vira-lata.
Com o incentivo de Onildo Almeida e Nelson
Ferreira (esse mesmo, do Frevo, compositor de “Evocação Nº 1”), começou as
gravações de músicas no qual as primeiras foram: “Carnavá de Ludugero”,
“Cumbuque de Ludugero” e “Ludugero Aponquentado”, todas gravadas em um disco 78
RPM de 1961. Além de músicas, ele grava também textos humorísticos todos
escritos por Luiz Queiroga e ainda interpretava vários compositores sertanejos
como Onildo Almeida, Elino Julião, Dílson Dória, Abdias Filho, Juarez Santiago,
Jacinto Silva e na maioria das vezes que os textos tinham fundos musicais,
tinha a participação de João do Pife.
Luiz Jacinto passou a interpretar outros
personagens também como Zé Beato (criado por Hilton Marques) e Virgulino
(criado por Luiz Queiroga). Inclusive, em 1964, foi trabalhar na TV Tupy no RJ
acompanhado de Irandir Costa e Luiz Queiroga e participou do programa “AEIOU
Urca” com o personagem Zé Beato.
Depois, ainda participou da Escolinha do
Professor Raimundo de Chico Anísio, fazendo os personagens Zé Beato e Ludugero.
Nessa época ele chegou pra fazer um show em uma
cidade e foi muito aplaudido, e daí respondeu aos aplausos: “muito obrigado
pessoal, nunca tinha visto tanto puxa saco junto”. A platéia caiu na risada e
um tempo depois Ludugero fez uma música em alusão a figura do puxa-saco com o
nome de “Cheleleu” (de composição de Luiz Jacinto e Elino Julião), gravado no
LP “Desquite de Ludugero e da véia Felomena” (CBS) de 1970:
“Cheleléu, ó Cheleléu
O teu lugar ta garantido lá no céu
Ó esse rapaz ainda morre de apanhar
Tudo que se faz ele corre e vai contar
Mais atrevido ainda arranja o chapéu
O teu lugar ta garantido lá no céu
Pode balançar, seu balançador
Pode anular, seu anulador
Tu pensas que és sabido
Mais tu é um cheleléu
O teu lugar ta garantido lá no céu”
Ludugero também era bom de verso e viola, como no
repente “Mistura de Viola” de composição de Luiz Queiroga, do mesmo LP de 1970.
No enredo, ele e mais um violeiro de nome “Juvená” pedem um mote pra Felomena,
e ela rapidamente responde:
“No bem da mulher amada / ta o bem da criação”.
A partir desse mote Ludugero quer recordar os
amigos Pinto do Monteiro e Otacílio Batista (dois grandes nomes da poesia de
viola no sertão. Pinto, considerado “A cascavel do repente”, de Monteiro-PB,
sertão do Cariri, e Otacílio, irmão de mais outros dois grandes nomes da poesia
de São José do Egito: Dimas Batista, e Lourival Batista, o Louro do Pajeú).
Segue um dos versos improvisado por Juvená:
“Eu avistei um jardim
E no jardim uma mulher
Mulher cheia de mistério
E a qual olhava pra mim
Terminou dizendo, enfim
És as minha solução
Eu lhe dei o meu coração
E saí dalí de mão dada
No bem da mulher amada
Ta o bem da criação”
Luiz Jacinto fez suas gravações pela CBS (a mesma
gravadora que gravou o 1º disco da banda de Pífano de Caruaru) no RJ e fazia a
promoção e divulgação dos seus discos pela Caravana Pau de Sebo se apresentando
em várias cidades do Nordeste. Jackson do Pandeiro, Marinês e Trio Nordestino
eram alguns dos artistas que participavam da caravana.
Mas no auge da carreira, no dia 14 de Março de
1970, morre Luiz Jacinto e Irandir Costa num acidente de avião na Baía de
Guajará Mirim, no Belém do Pará. O corpo de Luiz Jacinto só foi encontrado no
dia 30 de Março e sepultado em caruaru no dia seguinte. Em homenagem aos dois
personagens Coronel Ludugero e Ótrope, a Fundação de Cultura e Turismo de
Caruaru inaugura na praça Coronel Porto, na Rua Preta, em 1975, duas estátuas,
uma de Ludugero e outra de Ótrope, feitas pelo artista caruaruense Armando
Lacerda.
A morte de Luiz Jacinto e Irandir foi uma perda
muito grande não só pro Nordeste, mas para o Brasil como um todo. Logo depois
da morte deles o Trio Nordestino gravou uma música chamada “Norte e Nordeste
Chorou” (composição de J. Cavalcante e Osvaldo Oliveira), no disco “As Melhores
do Nordeste Vol 2” de 1970, em homenagem ao dois:
https://www.youtube.com/watch?v=-0QKj12c9oc
Na tentativa de resgatar o riso perdido com a
triste tragédia, Luiz Queiroga criou outros personagens como o “Coronel Ludrú”,
“Gerômo”, “Seu Pajeú” e “Zé Macambira”. Além desses outros surgiram por pura
admiração ao coronel, como “Coroné Caruá” até “Jerimum” e “o Véio Mução” tentam
reviver a alegria e o humor do coronel Ludugero.
“Já vi que tu aprendesse
Num és burro e entendesse
De voltar esse mourão
Tem pedrada e tem pedrão
Tem pedrão e tem pedrada
Isso que é mourão voltado
Isso que é voltar mourão”
(trecho de “Mourão Voltado”, versos do coronel,
em 1970)
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